quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Nem só de céu vive a Astronomia

Telescópios Gemini Sul (primeiro plano) e SOAR (segundo plano), localizados no Cerro Pachón, Chile.

(CNPQ) Em 2009 celebram-se importantes avanços da Astronomia e a sua grande contribuição para o conhecimento humano. Há quatro séculos ocorreu um dos eventos mais revolucionários e marcantes da história da ciência: as primeiras observações telescópicas dos mistérios do céu realizadas por Galileu Galilei. Não foi ao acaso que a Organização das Nações Unidas (ONU) escolheu este ano para ser o Ano Internacional da Astronomia, já que de quebra o mundo comemora, também, os 40 anos da chegada do homem a lua.

A Astronomia é uma das ciências mais antigas do mundo e deu origem a campos inteiros da Física e Matemática. Há poucos séculos, mal se tinha ideia da existência da nossa própria Galáxia e hoje sabe-se que existem centenas de bilhões delas correndo em todas as direções do Universo. Estudiosos vêm transformando o céu em um imenso e diversificado laboratório de Física, para mostrar que a vida na Terra está intimamente ligada às estrelas, através dos elementos químicos que elas produzem e da energia que fornecem. Nem só de céu vive a Astronomia, grande parte da aplicação tecnológica usada nessa área gera produtos que usamos aqui na Terra, no dia a dia.

Tecnologia para a Terra
Um exemplo simples são as câmeras digitais e celulares que tiram fotos e filmam. A captação da imagem digital foi primeiramente desenvolvida para equipar telescópios e somente depois foi possível popularizar seu uso. Outro exemplo são os métodos computacionais desenvolvidos para o estudo de imagens de galáxias que passaram a ser aplicados a imagens médicas ou imagens de satélites que vigiam o clima, devastações, queimadas, etc. Assim, as descobertas astronômicas têm um profundo impacto no conhecimento, já que contribuem intensamente para o desenvolvimento de novas tecnologias.

A Astronomia no Brasil é fruto de um projeto iniciado há 40 anos, que culminou com a aquisição de um telescópio de médio porte de acesso livre a toda a comunidade científica. O estabelecimento do primeiro Laboratório Nacional de Astrofísica do país (LNA), integrante da estrutura do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), ocorreu nos anos de 1980. De lá para cá, a astronomia brasileira vem chamando a atenção da comunidade internacional, com seu crescimento de 10% ao ano em termos de publicações e na formação de doutores. O amplo acesso à infraestrutura do LNA viabilizou o crescimento da ciência astronômica no Brasil, impulsionando a criação de condições otimizadas para o crescimento científico e tecnológico do país e projetando a astronomia brasileira no cenário internacional.

Embora jovem, a Astronomia Brasileira já teve conquistas notáveis. Um dos maiores avanços foi à criação de cursos de pós-graduação de qualidade, permitindo a formação de recursos humanos qualificados. Atualmente, o maior desafio é expandir os cursos para as regiões Centro-Oeste e Norte, pois hoje estão limitados ao Sudeste, Sul e Nordeste. No caso das duas últimas regiões existe a necessidade de maior incentivo, já que há apenas um programa de Doutorado, em cada uma.

INCT-A
Recentemente foi criado o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Astrofísica (INCT-A) que atingiu, nos primeiros oito meses de 2009, a marca de 100 artigos publicados em revistas internacionais de alto impacto. O Instituto, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e pelo CNPq, reúne 145 cientistas com doutorado de 27 instituições emergentes, que formam uma rede para planejar e implementar ações, tendo em vista o futuro da astronomia nacional.

O grupo está trabalhando atualmente em diversas atividades de pesquisa, entre elas o apoio ao desenvolvimento de instrumentação de ponta que permitirá ao Brasil participar dos maiores consórcios internacionais de telescópios, em vias de implementação. Segundo Iranderly Fernandes, astrônomo e bolsista do CNPq, uma das grandes iniciativas da astronomia brasileira foi fazer parte dos consórcios internacionais dos telescópios Gemini e SOAR (Southern Observatory for Astrophysical Research), ambos localizados em Cerro Pachón, no Chile. Membro do INCT-A, o pesquisador afirma que o Brasil conta com aproximadamente 500 profissionais na área de astronomia e figura no cenário mundial em uma boa posição.

“Poderia dizer que até somos uma potência em Astronomia. Para se ter uma ideia, o Brasil detém apenas 3% do tempo dedicado à pesquisa do Observatório Gemini, já que o número de noites por ano disponíveis para o Brasil é de apenas 8. Porém, nossos astrônomos produzem em torno de 50% da pesquisa deste observatório. O que mostra o quanto a astronomia brasileira é eficiente”, afirma Fernandes.

A boa performance dos pesquisadores brasileiros no Gemini levou o Ministério da Ciência e Tecnologia a duplicar a participação nacional, já em 2010. O governo ainda estuda a participação do Brasil no telescópio de 42 metros, o Extremely Large Telescope, que a Europa planeja construir nos Andes chilenos.

O papel brasileiro no projeto SOAR é maior, não só quanto ao montante de recursos, mas também quanto ao grau de desenvolvimento. O Brasil investiu US$ 14 milhões, o que lhe garante anualmente 33% do tempo de uso do telescópio. A participação brasileira no telescópio mais moderno em sua categoria, na atualidade, foi um salto para o país.

Hoje, a Astronomia está passando por uma revolução. O tema do momento é o acesso aos dados astronômicos de forma digital. Ou seja, os telescópios e os institutos de pesquisa em astronomia estão disponibilizando as pesquisas e informações coletadas em grandes bancos de dados que podem ser acessados pela comunidade.

“Ferramentas computacionais estão sendo desenvolvidas para disponibilizar aos estudiosos e também à comunidade o acesso livre a diversos dados astronômicos desenvolvidos no país e no exterior. O Observatório Virtual Brasileiro (BRAVO) e o Dark Energy Survey (DES) são projetos relacionados a esta revolução digital. Se desenvolvermos mais nesse aspecto, com certeza saltaremos várias posições no ranking mundal”, afirma Fernandes.

Cientistas brasileiros apresentam programas de pesquisa utilisando observações com o COROT
INEspaço
Além do INCT-A, há também o Instituto Nacional de Tecnologias e Ciências do Espaço (INEspaço), que busca produzir resultados em diversas áreas, entre elas navegação e exploração planetária. Segundo o coordenador do INEspaço, Renan de Medeiros, hoje o Brasil vem desenvolvendo pesquisas em praticamente todas as áreas da astronomia, em muitas delas com os mesmos padrões e qualidade internacionais.

“Até na área da Exoplanetologia, que se dedica à busca e ao estudo de planetas fora do Sistema Solar, estamos realizando pesquisas competitivas. Estamos indo muito bem, mas dá para avançar mais. Hoje temos astrônomos brasileiros fazendo parte de comitês internacionais de expressão, temos cientistas brasileiros participando de colaborações científicas que se estendem da Exoplanetologia à Cosmologia, tanto individual quanto institucionalmente. Tudo isso é expressão de reconhecimento da nossa competência na área”, diz Medeiros.

O astrônomo afirma ainda que é necessária uma ampliação de investimentos para todas as áreas da astronomia e o surgimento de editais específicos, como aquele dedicado às comemorações do Ano Internacional da Astronomia, porém, agora voltados para a pesquisa e formação de pessoal. “O CNPq está fazendo isto hoje muito bem. Mas não pode haver descontinuidade. Ao mesmo tempo, é necessário que outras agências de fomento, em particular as fundações estaduais, sigam o exemplo”, afirma Medeiros.

De olho no futuro
O interesse do público pelo espaço cósmico nunca foi maior. Para que os conhecimentos da Astronomia cheguem cada vez mais à população, o INEspaço, tem como uma de suas principais metas criar a ‘TV Espaço’, voltada para a geração de vídeos e programas em Astronomia e Ciências Espaciais para as instituições públicas de ensino. “Estimular a criação de canais de comunicação, programas de divulgação e de educação em longo prazo para o engajamento de jovens na carreira científica é essencial. Além disso, é preciso também o apoio perene a planetários, exposições itinerantes e ‘espaços-ciência’ que ofereçam à sociedade verdadeiras janelas abertas para o Cosmo”, finaliza Medeiros.

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