(Cristóvão Jacques - UOL) O Brasil é hoje visto como um país que tem evoluído bem na astronomia. Neste ramo da ciência, temos crescido a uma impressionante taxa de 10% ao ano em novos pesquisadores. Prova disto é que foi realizada no Rio de Janeiro, em 2009, a Assembleia Geral da União Astronômica Internacional.
A escolha das sedes de reuniões como essa leva em conta o interesse da comunidade astronômica internacional nas atividades desenvolvidas no país sede. Isto foi um sinal claro que o Brasil é notado como um polo de pesquisa astronômica em franco crescimento. Temos que aproveitar isto.
O ESO (European Southern Observatory) é uma organização intergovernamental de pesquisa em astronomia, que engloba 14 países europeus. O Brasil foi convidado a participar desta organização e em 2010 assinou um acordo para adesão, que previa pagamentos de cerca de € 270 milhões ao longo de dez anos.
O problema é que o texto do acordo ainda está parado na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados, ameaçando a inclusão do Brasil na organização. O ESO construirá nos próximos anos o maior telescópio do mundo (o E-ELT, de 39 metros de diâmetro), e o Brasil não possui em seu território sítios apropriados para a construção de grandes telescópios - o maior telescópio brasileiro está em Brazópolis (MG), no Observatório do Pico dos Dias.
A demora na aprovação deste acordo pode custar muito caro para a astronomia nacional. A entrada no ESO trará uma oportunidade única para o país mudar de patamar em termos de competividade e tecnologia, sem falar no aumento de mestres e doutores que isto irá trazer. A indústria nacional também irá se beneficiar, podendo fornecer serviços e equipamentos para os novos observatórios que serão criados.
Não podemos fazer outro papelão que nem fizemos na participação da construção da ISS (Estação Espacial Internacional), quando fomos expulsos do consórcio por não cumprir a nossa parte no acordo. O Brasil precisa criar uma cultura menos burocrática para fazer as coisas acontecerem. Perdemos muito com coisas que poderiam ser resolvidas em tempo mais curto e que gerariam uma produção cientifica bem mais rapidamente.
Astrônomos amadores
Um outro problema enfrentado pela astronomia brasileira hoje é a pouca colaboração entre astrônomos amadores e profissionais. Tempo de telescópio é uma coisa cara. Muitos astrônomos amadores possuem bons equipamentos e tem capacidade técnica para fazer observações astronômicas de qualidade para serem usadas em pesquisa. Os astrônomos profissionais poderiam usar mais os trabalhos e os recursos que os astrônomos amadores podem oferecer.
Uma das exceções é o grupo liderado pelo astrônomo Felipe Ribas do Observatório Nacional, que organiza junto com outros astrônomos profissionais e amadores campanhas para observações de ocultações de asteroides transnetunianos. Foi através de uma dessas campanhas que Ribas e equipe descobriram anéis em torno do asteroide Chariklo.
Outras iniciativas de astrônomos amadores são igualmente importante. Criamos o Sonear (Southern Observatory for Near Earth Asteroids Research) para descobrir e monitorar asteroides que passam perto da Terra (Neos, na sigla em inglês). Desde dezembro de 2013 foram descobertos 9 Neos e 2 Cometas, além de alguns asteroides do Cinturão Principal (região entre Marte e Jupiter) e recuperação de 2 Neos que há muito tempo não eram observados.
Hoje, o Sonear é o único observatório no hemisfério sul a fazer este tipo de pesquisa de forma sistemática. Trata-se de um projeto financiado com recursos particulares , gerido e operado por astrônomos amadores (Cristóvao Jacques, Joao Ribeiro e Eduardo Pimentel). Não está vinculado a nenhum órgão de pesquisa e fica próximo a cidade de Oliveira (a 150 km de Belo Horizonte).
Outros problemas
Além da entrada no ESO e a pouca colaboração entre astrônomos amadores e profissionais, há outras problemas na astronomia do país.
Precisamos repensar a pressão que os cientistas brasileiros sofrem para publicar cada vez mais artigos. A politica do ensino superior leva ao pesquisador a publicar o máximo possível, e às vezes se publica de qualquer jeito, perdendo qualidade. O número de artigos publicados por cientistas brasileiros tem crescido muito, porém a qualidade não acompanha este crescimento.
Também é ruim que os observatórios do país não tenham uma legislação que proteja contra a poluição luminosa. As luminárias que temos nas grandes cidades não são projetadas para eficientemente iluminar o que interessa: o chão. Grande parte da luz é jogada para cima, iluminando o céu. Este desperdício de energia chega a ser de 30%. Se tivéssemos luminárias mais eficientes, economizaríamos cerca de 1% da energia gerada no país. O gasto com a iluminação pública consome 3% do total de energia produzida.
Um país que investe em astronomia facilita a formação de pessoas mais cidadãs e conscientes do valor dos recursos disponíveis na Terra, mais solidárias, criativas e menos egoístas.
O Brasil precisa em todos os setores, colocar em seu vocabulário três palavras para que façam parte de sua cultura: planejamentos, gestão e produtividade. O país necessita melhorar os seus trâmites para decidir as coisas com mais agilidade, maior senso de urgência e mais responsabilidade.
Ps: Vale homenagear o recém-falecido e grande astrônomo Ronaldo Rogério de Freitas Mourão. Além de ter tido uma importante vida científica, Mourão foi o principal divulgador dessa ciência no Brasil. São muitos os que começaram a olhar para o céu por causa de seus inúmeros livros sobre a astronomia. Uma pena que a mídia não tenha lhe feito uma homenagem do tamanho que ele merecia.
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